terça-feira, março 06, 2007

"PORTUGAL E ESPANHA: OS BONS ALUNOS" e outros assuntos

Vejam só estas tácticas da OCDE:
(A propósito não sei se sabem que a nossa Maria de Lurdes esteve uns tempos a trabalhar em tão benemérita instituição.)
"PORTUGAL E ESPANHA: OS BONS ALUNOS

Pergunta-se então a organização: como fazer aceitar reformas do mercado de trabalho que corresponderiam aos interesses dos assalariados e dos desempregados mas que eles não querem? As recomendações feitas aos governos dos povos tumultuosos são sublinhadas a negro e a itálico no relatório: é preciso proceder a «reformas parciais: reformar marginalmente para pôr em aplicação ulteriores e mais profundas mudanças de política». A ofensiva tem pois de passar pelos flancos e minar os contrafortes mais frágeis do sistema salarial, reservando para um segundo assalto o “núcleo duro”: «Para se evitarem conflitos com os principais grupos de interesses, os governos, num primeiro tempo, podem introduzir reformas à margem do “núcleo duro” do mercado de trabalho, sem verdadeiramente tocarem nas estruturas institucionais de que beneficiam os trabalhadores. Isso tende a reforçar a dualidade do mercado de trabalho, permitindo depois obter progressivamente o apoio da opinião publica a reformas mais fundamentais das instituições e políticas do mercado de trabalho».
A organização dá o exemplo da Espanha e de Portugal, onde esta estratégia foi posta em prática com êxito. Em Portugal, em particular, foram liberalizados o trabalho temporário e os contratos de duração determinada, antes de serem alargados aos contratos de duração indeterminada os motivos válidos de despedimento e de ser abolida a autorização prévia dos despedimentos colectivos.
Essa batalha bem organizada, conclui a OCDE, «colocou provavelmente os trabalhadores titulares de um contrato permanente em posição de fraqueza para se oporem às reformas, na medida em que os trabalhadores temporários e desempregados eram relativamente numerosos». Nesta estratégia duma abordagem pelos flancos, visando romper a frente de combate através das linhas de menor resistência, é fácil perceber que o mais eficaz consiste em atacar primeiro os próprios desempregados."
Outros assuntos
"Tal como não é pelo facto de alguém estudar que se cria empregos qualificados, nem é por alguém se pôr à cata de cogumelos que eles vão crescer, nem é por alguém querer ficar apaixonado que surgem lindas raparigas ou belos mocetões (embora, neste caso...), também não é o facto de alguém se pôr à procura de emprego que cria emprego! “Deixemos os desempregados em paz!” deveria ser a única máxima respeitável quando o nível da procura efectiva e o apetite de acumulação dos empresários se mostram insuficientes para que se realize a esperança de toda a população encontrar trabalho.
A boa fé poderia mesmo levar a admitir, quando o emprego falta, e face ao amoralismo dos prelados defensores do trabalho penoso, que a racionalidade económica mais bem pensada exige que se proclame a instituição do desemprego voluntário. De facto, quando a penúria se instala, mais vale frustrar os que têm menos necessidade desse “bem” tão desejado. Desde há dois séculos, entregámos as chaves da casa à economia de empresa privada, para o bem e para o mal. Quando surge o mal (o “bem” aconteceu às vezes, quando o mundo capitalista desenvolvido era keynesiano-fordiano), a razão “liberal” no verdadeiro sentido da palavra exigiria que se moderasse ao máximo o duro esforço da colectividade, deixando os indivíduos “escolher” quem deve estar desempregado e quem deve ocupar um emprego. Não é precisamente esta a orientação que se está a esboçar...
Desde há muito tempo, os povos sabem que é graças ao produto dos seus impostos que são enviados para a guerra. A novidade radical agora surgida é que, ao financiarem a OCDE, eles erguem exércitos contra si mesmos."

Quem quiser ler o resto do artigo onde esta citação está contida, chamada "Os economistas em guerra contra os desempregados" sirva-se.

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10 Comentários:

Blogger Nan disse...

Assustador, não é?

12:08 da tarde  
Blogger Pedro disse...

Quando a resposta governamental é ter sucesso escolar à força a pensar nas estatísticas do Eurostat e da OCDE, estamos conversados sobre o futuro que nos espera...

4:43 da tarde  
Blogger IC disse...

Dizes bem, Henrique: São as "tácticas"...

1:55 da manhã  
Anonymous Anónimo disse...

Caro Henrique,

veja este texto, p.f.:
http://dn.sapo.pt/2007/03/04/opiniao/a_religiao_mercado_deus_mamona.html

5:27 da tarde  
Blogger henrique santos disse...

Obrigado S.L.
o texto é muito interessante. É aliás interessante ver como pessoas de vários quadrantes políticos, ideológicos e religiosos mas com sentido humanístico conseguem detectar no neoliberalismo (e seus correlatos neoconservadores) algo de profundamente destrutivo para a humanidade.

11:00 da tarde  
Anonymous Anónimo disse...

De acordo. Mas ANselmo Borges é uma voz contra-corrente nesta ICAR, primeira empresa global...

12:25 da manhã  
Anonymous Anónimo disse...

Bourdieu fez esta mesma inquietante análise num artigo que julgo ser pioneiro acerca das falácias e esquemas do neoliberalismo e que li aqui: ttp://www.monde-diplomatique.fr/1998/03/BOURDIEU/10167
Mas nunca se espera que as coisas vão tão longe. Ou que o nosso insignificante país seja justamente O Bom Aluno.
«Desde há muito tempo, os povos sabem que é graças ao produto dos seus impostos que são enviados para a guerra. A novidade radical agora surgida é que, ao financiarem a OCDE, eles erguem exércitos contra si mesmos» - W.Reich previu este cenário. Outros talvez também. O que assusta é que agora parece não haver estrutura ideológica que mobilize as pessoas e sustente uma forma de reacção eficaz - o sistema vem rompendo todas solidariedades sociais (as escolas e o modo como estamos a ser "trabalhados" lá dentro ilustra-o bem) e deixa-nos à mercê, cada um na sua célula... É um esquema infernal.

2:12 da tarde  
Blogger henrique santos disse...

Soledade
não se esqueça que, felizmente, há também movimentos alternativos que contrariam este "esquema infernal". Os fóruns sociais regionais e mundiais são alguns dos exemplos. Há que encontrar formas de resistência e de alternativa.

3:16 da tarde  
Anonymous Anónimo disse...

Às vezes esqueço-me, é verdade. A revolta que não acha saída mata-nos de desesperança. Mas o Henrique tem razão.
Boa semana, e obrigada pelas palavras de alento.

10:32 da tarde  
Anonymous Anónimo disse...

naquele livro de que lhe falei, Ignacio Ramonet aponta as organizações não governamentais como o futuro campo social da "resistência" - ou, pelo menos, da militância contra os poderes instalados.

1:44 da tarde  

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