sexta-feira, setembro 01, 2006

EXAMES. Instrumentos para... Instrumentos em si...

EXAMES. Instrumentos para...
O Diário de Notícias de hoje tráz duas peças dignas de leitura e análise.
Uma a "notícia" sobre o "facto" de os exames do 9.º ano aumentarem as percentagens de reprovação nesse mesmo ano lectivo. Outra (sem link), uma coluna de opinião da ministra em que este facto e esta notícia são salientados.
Aparte o facto do aparecimento aparelhado destas duas peças nos poderem soltar a imaginação sobre as relações entre os jornais e o poder, gostaria mais de tecer alguns comentários sobre aspectos que considero centrais no seu conteúdo:
-logo no título do escrito da ministra aparece: "Melhorar a escola é melhorar os resultados". A orientação sobre os resultados da ministra é o lema central do seu discurso;
-segundo ela estes resultados são negativos, -dos piores dos dez últimos anos, - mas (segundo o seu ministério) o seu conhecimento "objectivo" poderá ter consequências positivas no futuro;
-se não forem retiradas as devidas consequências da insuficiência das aprendizagens que os resultados nos exames demonstram estes continuarão a ser, e cito, "meros instrumentos de selecção e seriação dos alunos";
-a grande solução para a melhoria dos resultados será "a optimização da capacidade técnica e de inovação dos professores e de outros profissionais da educação". O discurso tecnocrata no seu explendor.
Destas ideias gostaria de fazer uma análise crítica que espero não abusiva:
-o que interessa são os resultados. Resultados, para já, no Português e na Matemática e avaliados pelos exames. Deitem-se fora todas as críticas fundamentadas feitas a esta forma tecnocrática de avaliar a educação, ou mais propriamente a instrução. Tudo aquilo que não puder ser avaliado por exames e traduzido em resultados (numéricos, presumo) é de dispensar;
-se os resultados forem melhores então de "meros instrumentos de selecção e seriação dos alunos" (aqui aplauda-se a sinceridade da ministra) passarão a instrumentos... que não meros;
-os exames não são nunca postos em questão como aferidores da qualidade das aprendizagens, são até o seu paradigma perfeito. Deite-se fora toda a crítica fundamentada aos exames como meios de avaliação.
Algumas perguntas que, aposto, a ministra não fará:
-como é que a sociedade e as políticas sociais dos governos podem ter influência nas escolas, na Educação e até, nos resultados dos alunos?
-como é que a desigualdade e a exclusão social cada vez maior na sociedade portuguesa têm influência nas escolas e nos resultados dos alunos?
-quem são os alunos, (quais as suas características, designadamente as sócio-económicas) que enchem os números redondos das reprovações?
-porque é que, estatisticamente, os que reprovam têm certas características e os que não reprovam têm outras?
-será que com os alunos que passam e passarão, com os critérios de resultados em exames, tudo está bem?
-que consequências tem para os processos educativos e para a formação dos alunos, esta centração em resultados, resultados, medíveis com exames?
EXAMES EM SI.
Sobre os exames como instrumentos de avaliação gostaria de deixar para já uma pergunta que lançaria a quem tenha estudado profundamente estes assuntos:
-Há quase um século que estudos científicos, nomeadamente os docimológicos, têm demonstrado a falta de validade, de fiabilidade e até de "objectividade" dos exames. Será que essas demonstrações foram desmentidas entretanto e/ou que estes instrumentos foram tecnicamente melhorados para ultrapassar as insuficiências que lhe eram apontadas? A pergunta não é retórica, nem fácil. Gostaria que alguém me respondesse.

7 Comentários:

Blogger Miguel Pinto disse...

Pois... respostas? hummm... espera sentado ;)... fez em Julho um ano, escrevia dois textos: Este e este.

4:06 da tarde  
Blogger henrique santos disse...

De facto provavelmente esperarei sentado ou terei de procurar mais activamente.
Por exemplo a questão da fiabilidade dos exames era colocada há 80 anos por Pieron, com estudos que demonstravam a diferença de resultados obtidos nas provas de exame corrigidas por examinadores diferentes ou em diferentes momentos pelo mesmo examinador. E isso em matérias consideradas muito objectivas como a Matemática. Será que as coisas mudaram entretanto.
Quanto à questão da validade é inegável que muitos dos "resultados" mais valiosos da Educação não são avaliáveis por exames.
Estas questões não estão na ordem do dia por terem sido ultrapassadas ou porque simplesmente estão ocultadas pelo politicamente correcto em educação?

5:45 da tarde  
Blogger «« disse...

Ei, amigos...por acaso já vos passou pela cabeça que essa ministra é socióloga do trabalho?...de educação ela não entende nada...está tão interessada em acabar com a escola que nem se deu ao trabalho de ir buscar quem entendesse de educação para escrever os seus artigos de opinião...um pouco mais a sério, fico feliz quando vos leio, assim sinto-me acompanhado...

11:20 da tarde  
Blogger henrique santos disse...

De facto Miguel Sousa, tens toda a razão. Deve ser mesmo ela que os escreve.

11:48 da tarde  
Blogger IC disse...

Não sei responder à tua última pergunta, mas sobre as consequências da centração nos resultados dos exames não tenho nenhuma dúvida de que serão más, de que é um erro estabelecer uma relação directa entre esses resultados e a real preparação e o habitual desempenho dos alunos. Dentro das minhas pequenas amostras de alunos do 9º ano tive este ano e no ano passado casos que não me deizam nenhuma dúvida disso, até porque me poderia eu pôr em causa se as discrepâncias entre os níveis que atribuí e as notas de exame fossem uma tandência geral nas minhas turmas, mas não é o caso. Mas, bastou ter casos anómalos para perceber, até falando depois com os respectivos alunos, que numa situação de exame, e um só, aquela prova só, pode haver vários factores que concorrem para certos resultados deste ou daquele aluno. Na altura até escrevi um post por causa de uma aluna excelente (excelente mesmo) que me teve um 3 no exame e tive imensa pena de não a ter encontrado para perceber o que se passou (fora o meu único 5, mas dei quatros que se mantiveram no exame, entretanto essa aluna não foi o único caso anómalo, e numa amostra só de duas turmas esses casos fazem uma percentagem a considerar, e ouvir como eles explicam o acontecido reforça bem a ideia de haver factores que tornam um erro centrar as conclusões só em resultados de exames. Já agora, só outro exemplo, este do outro ano, de um aluno de 4 que me teve um 2 no exame, com esse falei e a razão foi simples: nesse ano o exame já não podia alterar o resultado final, desleixou nas férias de ponto e não se esforçou no exame, depois ficou envergonhado - "fui na onda, setôra, entrámos nisso de o exame não valer para nada, que vergonha, agora andam todos a falar de nós e dos professores" - mas encontrei-o mais tarde e estava com 16 no Secundário - afinal, era aluno de 2 como pareceu no exame, ou mesmo de 4?)
Porque é que nenhum jornalista sério (ainda deve haver disso) se lembrou de ir entrevistar alunos à saída da prova de matemática do 9º? - perguntar mesmo e ouvir, não é fazer aquelas perguntas banais à frente de câmaras. Claro que não chegaria por aí a nenhuma conclusão 'científica', mas ficaria com algumas pistas que valeria a pena considerar e tentar analisar.

É um facto que os nossos alunos do 9º ano têm dificuldade na resolução de problemas, isso não me explica a tão elevada percentagem de resultados negativos no exame pelo país todo, mas obviamente que contribui para ela. E a principal razão dessa dificuldade tem a ver com a leitura e interpretação de enunciados e com a retenção dos dados e até das perguntas. Mas isso não é um problama a ver só com a Matemática, nem sequer principalmente com ela, como também não se podem dar explicações simplistas tais como são uns distraídos ou cabeças no ar, e uma questão me paira há tempo na cabeça: não se anda a passar nada com a capacidade de atenção à informação escrita e de apreensão da mesma, não se deveria fazer algum estudo sobre isso? Que influência anda a ter o facto de a maioria dos alunos de hoje não ler livros e os meios privilegiados da sua recepção de informação serem audio-visuais?
Ai, desculpa, Henrique, isto já não tem a ver com o teu post (Mas não tenciono voltar a postar sobre exames e resultados, aproveitei para deixar a pergunta, mas não vou estender-me mais a dar exemplos de que ela é capaz de ser pertinente)

4:19 da tarde  
Blogger henrique santos disse...

Isabel
obrigado pelas questões e dados que apresentas. Lembro-me bem do post interessante que colocaste nessa altura.
Uma coisa para mim é bastante pacífica: não é um exame (mesmo que muito bem feito e bem classificado) com um tempo limitado e sujeito a tantas contingências, que pode avaliar melhor do que a avaliação contínua de um bom professor. A possibilidade de falhar estará muito mais no lado do exame.
Afinal os exames são apenas um instrumento de classificação dos alunos, entre muitos outros. Têm vantagens e desvantagens como todos os outros. Há situações, por exemplo o dos alunos externos, o dos alunos das entidades privadas, etc, em que os exames podem e devem desempenhar um papel importante. Só que a forma totalitária com que eles são encarados têm submergido todos os outros, servindo interesses que não o dos alunos e a Educação.
O exemplo dos rankings das escolas e a sua publicação é um dos exemplos mais nefastos. Mas na verdade, se calhar o mal nem está nos exames mas no uso que se tem feito deles.

3:17 da tarde  
Blogger zoltrix disse...

"-como é que a desigualdade e a exclusão social cada vez maior na sociedade portuguesa têm influência nas escolas e nos resultados dos alunos?"

Peguei nesta sua frase apenas para salientar a extrema violência psicológica a que milhares de crianças do 1º Ciclo passarão a se sujeitar nas "novas escolas" para onde vão de empurrão, pois as suas FECHARAM! Essas crianças irão sofrer, por parte das outras, a natural exclusão social ou "regional" pois vêm das "aldeias"...
Falo com conhecimento. Exceptuando alguns casos, aprenderão a ser ostracizadas por colegas e profes. "Carimbadas" como toscas, bimbas ou outra qualquer (in)definição do género, sentirão o estigma, envegonhar-se-ão, remeter-se-ão ao silêncio, definherão longe das suas raízes, dos seus avós e famílias. Procurarão copiar maneiras de ser para tentarem integrar-se, mas, infalivelmente, só serão capazes de copiar os piores tiques urbanos.
O seu insucesso deixará de estar inscrito no universo das escolas pequenas e passará a estar diluído nas grandes escolas, passando a ser mais desapercebido. Que bom!!! Com este "sucesso" mais as profes a menos das vagas que fecharam vão-se poupar milhôes! Que bom!!! O Mistério da Educação soma a segue, na destruição do sistema de ensino que havia. Quem é que dentro de 5 ou 10 anos irá apanhar os cacos?

9:18 da tarde  

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