quinta-feira, agosto 28, 2008

Dermeval Saviani

Dermeval Saviani é um nome consagrado da Pedagogia brasileira. Acabei de reler o seu célebre livro Escola e Democracia e em pesquisa na net encontrei o seu site. Vale a pena explorá-lo. Aqui deixo um pequeno excerto de uma entrevista a servir de aperitivo para mais leituras deste autor. Os problemas da Educação são muito semelhante por esse mundo fora. No caso desta entrevista vejam as semelhanças notórias entre questões da política da Educação no Brasil com as do Portugal actual.
"2. Existe realmente esta “cultura da repetência” que o ministro da educação Paulo Renato alega existir?
R. Não considero apropriada a expressão “cultura da repetência”. A palavra “cultura” remete à noção de “sistema de valores”, como se pode observar na definição clássica de cultura que a considera como os modos de pensar, agir e sentir de um povo. Ora, nesse contexto, cultura da repetência estaria significando que a repetência é tida como um valor positivo levando os professores a considerar que reprovar é bom, isto é, o bom professor é aquele que reprova. Admitidas as exceções de praxe, entendo que não é esse o sentimento dominante entre os professores. Afinal, há cerca de 70 anos (recorde-se o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova lançado em 1932) vem sendo execrada a figura do professor tradicional, autoritário, aquele que estaria sempre de algum modo predisposto a lançar mão do instrumento da reprovação para se impor diante dos alunos. Nessas circunstâncias, o recurso à expressão “cultura da repetência” não passa de uma maneira de mascarar as condições precárias a que estão relegadas as escolas públicas, condições essas que impedem os professores de ensinar e os alunos de aprender, levando aos altos índices de repetência apurados pelas pesquisas. Não é, pois, por acaso que a referida expressão freqüenta, geralmente, o discurso dos governantes que têm sob seu encargo a formulação e execução da política educacional. Mascarando as razões reais da repetência com a alegada “cultura da repetência”, eles elidem, assim, a própria responsabilidade diante dessa situação. Assumindo uma diretriz política que comprime cada vez mais os investimentos em educação, o que agrava as suas condições precárias, eles tentam jogar para os professores e para a própria população a responsabilidade por esse estado de coisas. "
"4. O ministro Paulo Renato defende a promoção automática como solução para reduzir com a repetência. O senhor acha que isso é solução? Por que?
R. Definitivamente, a promoção automática não é solução para o problema da repetência. Isto porque, como se infere da própria denominação, a passagem é automática, isto é, os alunos são promovidos independentemente do que fizeram ou deixaram de fazer. Ou seja, quer se tenha atingido os objetivos quer não, tenham ou não preenchido os requisitos, a aprovação irá ocorrer. Deixa de ser relevante, assim, o desempenho tanto dos alunos como dos professores. Coisa diversa é o empenho em se atingir a meta da “repetência zero”, vale dizer, o objetivo de que todos sejam promovidos. Aqui se trata de criar as condições para que todos os alunos atinjam os objetivos definidos para os diversos componentes curriculares que integram o processo de ensino-aprendizagem. Em verdade, a defesa da promoção automática se liga mais ao objetivo de melhorar as estatísticas dos serviços educacionais do que ao objetivo de garantir a qualidade do ensino. Com efeito, tenho observado que os atuais responsáveis pela política educacional parecem mais preocupados em melhorar as estatísticas educacionais do que em melhorar a qualidade das escolas. Assim, se se adotasse imediatamente a promoção automática, os índices de repetência tenderiam a cair para zero e estatisticamente o problema estaria resolvido. No entanto, nem por isso a situação das escolas se alteraria, permanecendo o mesmo quadro de deficiências e precariedades que se associam, hoje, aos altos índices de repetência. O que precisa ser feito é equipar adequadamente as escolas e instituir uma carreira digna para o corpo docente como fizeram os países que, a partir do final do século passado, implantaram os seus sistemas nacionais de ensino, universalizando o ensino fundamental e, em conseqüência, erradicando o analfabetismo. Em condições adequadas o normal é que as crianças aprendam sendo, portanto, promovidas. Assim, resolve-se o problema da repetência porque as crianças, de fato, aprendem e não porque se decretou a promoção automática."
A ligação para o site encontra-se aqui.

3 Comentários:

Blogger IC disse...

"tenho observado que os atuais responsáveis pela política educacional parecem mais preocupados em melhorar as estatísticas educacionais do que em melhorar a qualidade das escolas"... Pois... nós por cá observamos o mesmo... :(

2:04 da manhã  
Blogger henrique santos disse...

Isabel
é interessantíssimo conhecer as politicas educacionais nos outros países. As semelhanças não são meras coincidências.

3:25 da tarde  
Blogger IC disse...

Henrique, calculo bem que as semelhanças não são meras coincidências, mas a sensação que eu tinha há poucos anos atrás era que Portugal copiava medidas que noutros países já estavam a ser repensadas e até a ser mudadas devido a mostrarem-se ineficazes. Actualmente confesso que não sei, não estou nada actualizada nessas leituras, mas acho importante que quem esteja divulgue.

1:49 da manhã  

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