segunda-feira, abril 30, 2007

John "Vitinha" Locke

Eis aqui o inspirador do nosso eterno presidente do Banco de Portugal, Lord Victor Constante, perdão, doutor Vitor Constâncio. Ainda há quem diga mal do nosso Vitinha. Vejam este seu antepassado inglês, numa citação de Istvan Meszaros, que podem ler aqui.
"No tempo em que John Locke escrevia, havia uma maior procura de pessoas empregáveis lucrativamente do que no tempo de Henrique VIII, mesmo que ainda muito distante do que veio a suceder durante a revolução industrial. Portanto a "população excedentária" em diminuição significativa não teve de ser fisicamente eliminada como anteriormente. Todavia, tinha de ser tratada de uma forma mais autoritária, racionalizando-se ao mesmo tempo a brutalidade e a desumanidade recomendadas em nome de uma alta e bombástica moralidade. Deste modo, nas últimas décadas do século XVII, em conformidade com o ponto de vista capitalista da economia política da época, o grande ídolo do liberalismo moderno, John Locke – um latifundiário absenteísta em Somersetshire bem como o responsável do governo mais generosamente pago – pregava a mesma "infantilidade insípida", tal como descrita por Marx. Locke insistiu em que a causa para "O crescimento dos pobres… não pode ser nada mais do que o relaxamento da disciplina e a corrupção dos hábitos; estando a virtude e a indústria como companheiros constantes de um lado assim como o vício e a ociosidade estão do outro. Portanto, o primeiro passo no sentido de colocar os pobres no trabalho… deve ser a restrição da sua libertinagem através de uma execução estrita das leis contra ela existentes [por Henrique VIII e outros]. [13] Recebendo anualmente a remuneração quase astronómica de cerca de £1,500 pelos seus serviços ao governo (como Comissário no Board of Trade, um dos seus vários cargos), Locke não hesitou em louvar a perspectiva de os pobres ganharem "um centavo por dia" [14] (a penny per diem), ou seja, uma soma aproximadamente 1.000 vezes inferior ao seu próprio vencimento em apenas um dos seus cargos governamentais. Não surpreendentemente, portanto, "O valor dos seus bens quando faleceu – quase £20,000, das quais £12,000 eram em dinheiro – era comparável ao de um comerciante próspero de Londres". [15] Um grande feito para uma pessoa cuja principal fonte de receitas era ordenhar – confessadamente de bom grado – o Estado!
Além disso, sendo um verdadeiro cavalheiro, com um muito elevado interesse a proteger, ele também queria regular os movimentos dos pobres através da medida perversa dos passes, propondo que: "Todos os homens a mendigar nos municípios marítimos sem passes, que sejam aleijados ou tenham mais que 50 anos de idade, e todos os de qualquer idade também mendigando sem passes nos municípios do interior sem qualquer orla marítima, devem ser enviados para uma casa de correcção próxima, para aí serem mantidos em trabalhos pesados durante três anos". [16] E enquanto as leis brutais de Henrique VIII e de Eduardo VI pretendiam cortar apenas " metade da orelha" dos criminosos reincidentes, o nosso grande filósofo liberal e responsável do Estado – uma das figuras dominantes do Iluminismo inglês – sugeriu uma melhoria de tais leis ao recomendar solenemente a perda de ambas as orelhas, a ser administrada àqueles que cometessem um crime pela primeira vez. [17]
Ao mesmo tempo, no seu Memorandum on the Reform of the Poor Law, Locke também propôs a instituição de casas de trabalho para os filhos dos pobres ainda de tenra idade, argumentando que: "Os filhos das pessoas trabalhadoras são um fardo comum para a paróquia, e habitualmente são mantidas na ociosidade, de forma que o seu trabalho também é geralmente perdido para o público até que eles atinjam doze ou catorze anos de idade. O remédio mais eficaz para isto que somos capazes de conceber, e o qual deste modo humildemente propomos, é o de que, na acima mencionada lei a ser decretada, seja além disso determinado que se criem escolas de trabalho em todas as paróquias, às quais os filhos de todos tal como exige o alívio da paróquia, acima dos três e abaixo dos catorze anos de idade … devem ser obrigados a ir". [18]
Não sendo ele próprio um homem religioso, a principal preocupação de Locke era combinar disciplina de trabalho severa e doutrinação religiosa com a máxima frugalidade financeira municipal e estatal. Ele argumentava que "Também outra vantagem de levar as crianças a uma escola prática é que desta forma elas podem ser obrigadas a ir à igreja todos os domingos, juntamente com os seus professores ou professoras, na qual podem ser levados a ter algum sentido de religião; ao passo que agora, de forma geral, no seu ócio e na sua educação descontraída, eles são totalmente estranhos tanto à religião e à moralidade como o são para a indústria ". [19]
Obviamente, então, as medidas que tinham de ser aplicadas aos "trabalhadores pobres" eram radicalmente diferentes daquelas que os "homens da razão" consideravam adequadas para si próprios. No final tudo se reduzia a relações de poder nuas, impostas com extrema brutalidade e violência no decurso dos primeiros desenvolvimentos capitalistas, desprezando a forma como eram racionalizadas nos "delicados anais da economia política", nas palavras de Marx."
Como as estórias da História se parecem!
Este excerto foi retirado do texto do autor citado "A Educação para além do Capital" que constitui uma pedrada no charco das visões idílicas sobre as pretensas virtudes da Educação fora das circunstâncias gerais que a condicionam.

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Pretextos

Aqui há uns anos alguém se lembrou que, para recuperar o degradado Parque Mayer em Lisboa, era necessário elaborar um projecto que incluiria um casino que tornasse rentável esse investimento. Que polémica que tal proposta, e com razão, gerou na altura.
Passados uns anos o Parque Mayer mantém-se na mesma, nada se recuperou, apenas existe, segundo sei, um projecto de um arquitecto famoso, projecto esse que custou imenso dinheiro.
Entretanto já existe em pleno funcionamento o Casino de Lisboa nas instalações da ex Expo.
Afinal não seria o objectivo formalmente e inicialmente apontado um mero pretexto?
Quem lucrou com estes negócios?

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domingo, abril 29, 2007

Blogs de referência pessoal

O Miguel Pinto desafiou-me a fazer-me uma lista dos blogs que mais me fazem pensar. Ora eu, embora seja um frequentador da blogosfera, percorro frequentemente poucos blogs, quase todos de pessoas que considero amigas (e que conheço só deste meio).
Se me fazem pensar, estes blogs são mais do que isso: são uma teia de cumplicidades, de confirmações ou confrontação de ideias, de fonte de informações.
P.S. Evidentemente há muitos mais blogs que leio e de que gosto. Optei por colocar aqueles a quem me ligo duma forma mais pessoal.

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sábado, abril 28, 2007

Falar com Desassombro.

Remeto os meus caros leitores para um texto de São José Almeida no Público de hoje, "Sobre a importância da greve geral", que poderão ler na totalidade no blog do Miguel Pinto. É um texto desassombrado e corajoso nos tempos que correm.
Alguns comentários deixo aqui:
-como é possível que alguns "sindicalistas", refiro-me à UGT e aos ditos sindicatos Independentes, considerem não estar reunidas as condições para uma greve geral em Portugal? Querem primeiro ver os trabalhadores completamente de joelhos ou de rastos?
-o único erro que vejo a CGTP cometer nesta situação é não ter, que eu saiba, formulado um convite formal de greve geral conjunta à UGT. Talvez já soubesse antecipadamente o que a casa gasta, mas pelo menos formalmente era aconselhável.
Este ano farei das comemorações do 1.º de Maio uma preparação para a greve geral de 30.
E nós professores, iremos aproveitá-la, ou passaremos ao lado com os argumentos do costume?

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quarta-feira, abril 25, 2007

A Poesia desceu à rua

"Este é o dia inicial inteiro e limpo"
Sophia de Mello Breynner
Há 34 anos vivi este e os dias posteriores intensamente. Eu era ainda uma criança no 5º ano de escolaridade, mas deu para perceber que esse era um dia muito Especial. As promessas que esse dia nos trouxe ecoam ainda fortemente na nossa sociedade, apesar de toda a vaga reaccionária que tenta submergir Portugal actualmente.
Veja-se aqui (no blog do Paulo Guinote) o quadro de Vieira da Silva com a frase deste post.

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terça-feira, abril 24, 2007

Educação pública: seus argumentos e caminhos.


Este é um excelente livro que aprofunda os argumentos da necessidade de uma Educação Pública nas nossas sociedades. Necessidade, convenhamos, quando é nosso objectivo a Educação de todos os cidadãos e não apenas daqueles que por razões económicas ou outras têm facilidade de acesso à Educação.

O autor, no entanto não se compraz na indicação de tal desiderato. Aponta o dedo a certos problemas com que a Educação Pública se tem confrontado e que não tem conseguido resolver. Daí retira conclusões sobre a necessidade de reconstrução dos nossos sistemas públicos de ensino de modo a que eles cumpram adequadamente os objectivos de uma Educação Pública de qualidade para todos.


Penso que este livro é dos melhores no género, pela forma clara e profunda com que aborda esta temática. Pena que, segundo sei, ainda não esteja editado em Portugal.


Recordo no entanto um texto sobre o qual já postei "Autonomia escolar: os riscos da privatização encoberta", cada vez mais pleno de actualidade também em Portugal e que podemos acessar no link respectivo.
Leiamos aqui as palavras que apresentam o livro na sua contracapa:
"La escuela pública es una instituición básica de las sociedades contemporâneas. Su fin primario consiste en procurar el desarrollo pleno de todos y cada uno de los alumnos. Pero non se debe ignorar la trascendencia social de la institución, porque la escuela - según su modelo organizativo - puede ser un mecanismo reprodutor de privilegios y desigualdades sociales o, por el contrario, un sistema que contribuya efectivamente a la redistribución de los bienes y reduzca la desigualdad social.
Por ello, Gómez Llorente, analiza en esta obra la función educadora del estado, y destaca el papel fundamental que corresponde a la escuela en la construcción del Estado de Bienestar o Estado Social de Derecho que propugna la socialdemocracia. Es éste un texto polémico frente as las tendencias neoliberales que, en su afán privatizador, socavan la esfera de lo público, debilitando el marco conceptual que fundamenta la escuela pública.
El núcleo de esta obra se dedica a comentar los cinco caracteres que según el autor deben informar la escuela pública, científica, laica, gratuita, democrática y comprensiva. Gómez Llorente entrelaza aquí el enfoque histórico con las dificultades que alla su implantación real en el momento presente. El capítulo sale al paso de las recientes teorias y hechos que erosionan la escuela pública: la llamada teoria de la libre elección; la tendencia a la gestión privada de los servicios públicos; así como la desmoralización del profesorado.
Esta obra constituye la reflexión de un profesor que intervino muy activamente en la elaboración de la ya distante Alternativa democrática de la enseñanza (1976), y que analiza lo que ha supuesto la proyección práctica de ésta en el último cuarto de siglo."


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domingo, abril 22, 2007

Do "jornalismo" no seu melhor

Na última página do Público de hoje na rubrica do "Sobe e desce" aparecem duas setas que só se explicam por critérios ditos jornalísticos absolutamente podres e enviesados:
-a eleição do Mário Nogueira para Secretário-Geral da Fenprof aparece com seta para baixo. Do conteúdo lá existente não se percebe se o negativo é: a eleição de um sujeito com bigode; de um professor de 1º ciclo; de um militante comunista; de que está disposto a fazer tudo para revogar o ECD do ME e defender a escola pública; ou de tudo ao mesmo tempo que, como sabemos, são defeitos absolutamente evidentes para todos.
-o ministro da saúde Correia de Campos aparece com seta para cima a propósito da entrada em vigor da nova lei do Aborto como lhe chamam. O conteúdo lá existente, e no que concerne à responsabilidade do senhor, refere que apesar da nova lei do aborto entrar em vigor hoje não está ainda nada regulamentada e que os hospitais não tem condições para a aplicar, o que referem, não é algo aceitável.
Do "jornalismo que temos" no seu melhor.

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sábado, abril 21, 2007

O caminho está pela frente

Fiquei contente com a eleição do Mário Nogueira como Secretário-Geral da Fenprof. Espero que daqui para a frente o caminho seja de combatividade lúcida e persistente como requer o momento que atravessámos. Espero que todos os dirigentes da Fenprof construam a partir daqui uma nova frente de luta, onde avulta a revogação do "ECD do ME". Se houve diferenças de projectos e pessoas é verdade que o plano de acção para o próximo triénio foi aprovado e assumido pelos dois candidatos. As grandes ideias eram as mesmas.
Se o conselho nacional da Fenprof tem maioria de apoiantes do Mário, também é verdade que o secretariado nacional de 35 membros tem maioria de dirigentes que o não apoiaram. Espero que todos saibam unir-se e melhorar a prestação da Fenprof em alguns aspectos onde é necessário melhorar.
Parabéns Mário. Para a frente Fenprof!

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sexta-feira, abril 20, 2007

Fenprof: um modo de estar no sindicalismo.

Há quem do exterior se refira ao sindicalismo docente como de um corporativismo ultrapassado. Quem como eu participou internamente e muito por dentro e ainda hoje participa como professor sindicalizado na Fenprof sabe que esta federação sindical nunca teve uma postura corporativa. Há problemas: não os nego e já tenho vindo a referir alguns de que acho que a Fenprof padece. Mas a Fenprof sempre teve, desde a sua fundação, uma preocupação de enquadrar as suas perspectivas num quadro muito mais lato do que as questões laborais a que o poder de hoje (e do passado) sempre quis remetê-la. Por vezes não conseguiu transmitir, por culpa própria, essa preocupação genuína - tão difícil de fazer em breves momentos que lhe são concedidos nos média.
Que essa preocupação é uma realidade é a principal razão que me leva a ser sindicalizado e não num sindicato qualquer mas na Fenprof. Os imensos textos, discursos, documentos produzidos pela Fenprof ao longo dos seus 25 anos de vida documentam essa realidade de que falo.

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A nova "Brigada do reumático".

Hoje, na TV vi um acontecimento que me fez relembrar a "Brigada do reumático".
Para os mais jovens ou menos recordados evoco a célebre cerimónia em que os generais e brigadeiros das forças armadas portuguesas foram prestar vassalagem ao presidente, almirante Américo Tomás. Outros eram os tempos, outros eram os motivos. Recordo que, pouco tempo depois, as patentes inferiores das forças armadas derrubaram o regime.
Agora, outra brigada do reumático foi prestar vassalagem ao jovem Sócrates que recebeu com expressão emocionada e mediaticamente encenada o apoio.
Se vejo semelhanças, vislumbro grandes diferenças. O primeiro acontecimento foi submergido pelo fenómeno democrático do 25 de Abril que permitiu liberdades cívicas ao povo e prometeu direitos às camadas populares. Neste segundo acontecimento, augura-se que o homenageado permaneça ao leme do governo ou - remota e em nada nova hipótese - seja substítuido pelos mesmos do costume. Há 33 anos o poder estava a cair de velho. Neste momento, os intérpretes dão-lhe uma aparência de novo.
Há quem diga que a história se repete, umas vezes na versão de tragédia outras na de farsa, ou vice-versa. Eu, nestes dois episódios só vislumbro farsa. Mais evidente no primeiro. Mais caricata no segundo.

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quinta-feira, abril 19, 2007

Uma Fenprof mais forte

Já estive em vários congressos da Fenprof. Neste que com certeza será um dos mais importantes, não vou estar. Marcaram a reunião de eleição de delegados na última semana de aulas, numa tarde em que eu, como director de turma, ao faltar iria prejudicar muito a preparação de uma actividade em que a minha turma estava envolvida. Resultado: não fui à reunião nem pude sequer ser candidato a delegado.
Soube que na DREL colocaram entraves legais à dispensa dos delegados ao congresso. Mais uma sacanice a que estamos habituados por este ministério que desgoverna a Educação.
Cada vez mais me convenço que isto só muda, designadamente estes atentados aos direitos cívicos dos professores, se nós, professores, vencermos o medo, a resignação, e lutarmos persistentemente e em força. Com greves mais fortes, com manifestações mais duras. Haja professores para isso.
Àqueles que apontam o caminho da luta jurídica eu digo: tudo bem, mas não chega. Até porque estes sacanas estão a fazer uma profunda contrareforma jurídica que desbasta direitos elementares. Quando as leis disserem amém aos ditames destes sacanas o que faremos?: submetêmo-nos sem mais. Lutamos só aí. Por mim acho que será tarde.
Também não sou adepto de lutazinhas repetidas que, pela rotina, podem desgastar mais do que motivar. Também sei que as greves bem conseguidas não nascem por geração espontânea ou por decreto e que são os sindicatos e os sindicalistas que devem estar na primeira linha para a mobilização. Mas sei que uma boa greve ainda é a forma de luta mais forte.
Uma Fenprof revitalizada para a luta precisa-se. Venha ela.

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quarta-feira, abril 18, 2007

A agenda a prazo para a Educação.

"Os três eixos da mercantilização escolar": um texto incontornável de um professor belga, Nico Hirtt, para todos aqueles que queiram entender o rumo (a agenda) que se está a tomar nos sistemas educativos em toda a Europa.

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terça-feira, abril 17, 2007

Há vida para além do canudo.

Há dias, penso que passou despercebida a intenção do ministro da Saúde de privatizar a gestão da ADSE. Deste ministro famoso pelas suas posições liberais não é surpresa uma proposta deste tipo.
Relembre-se que os funcionários públicos aumentaram a sua comparticipação para a ADSE este ano em 0,5% o que fez diminuir o ridículo "aumento" de 1,5% nos vencimentos para apenas 1%.
Lembre-se também que entraram recentemente em vigor as novas taxas "moderadoras para internamentos e cirurgias. (É sabido como os portugueses se pelam por uma boa cirurgia e por uma prolongado internamento!!!).
É bom relembrar que há mais vida em Portugal para além do percurso académico de Sócrates. E não esquecer as "marcas" liberais do governo "socialista" que nos desgoverna.

domingo, abril 15, 2007

Hipocrisias

Ao escrever o post anterior, confesso que estava longe de pensar que ele iria ser colocado de imediato na agenda política portuguesa. Foi-o através de uma iniciativa colateral ao "Roteiro pela Inclusão" promovido pelo presidente da república.
Assim, um economista, Farinha Rodrigues, veio afirmar o que constava há muito tempo dos escritos do economista Eugénio Rosa e que reproduzi no post anterior sobre desigualdade em Portugal. Nada afirma de novo, mas parece que tudo de novo afirma: Daniel Bessa, uma das sumidades dos pensamento económico dominante português, a moderar o debate, disse-se mesmo "esmagado"!
Para além do economista que revelou neste momento estes dados e para além da iniciativa pela inclusão que, talvez não intencionalmente, abre uma caixinha de dados deprimentes para muitos economistas e políticos portugueses, eu saliento a hipocrisia de muitos:
-a de Cavaco e Silva que durante o seu mandato de primeiro ministro cavou o fosso das desigualdades e que agora, como se nada tivesse a ver com esse facto, vem promover a inclusão. Repare-se quais as soluções que este chefe de Estado propõe: baseiam-se, em grande parte, em iniciativas caridosas centradas em organizações não governamentais ou nas próprias famílias. Senhor presidente, estes problemas têm origens fundamentais nas políticas económicas do Estado e é nele que muitas das soluções efectivas poderão concretizar-se.
-A dos economistas do regime que tão liberais são no apontar dos caminhos económicos e que, depois, perante números indesmentíveis sobre as consequências humanas desses caminhos, se sentem esmagados... Enfim, mais vale sentirem-se esmagados do que nem sequer sentirem nada como muitos outros. Mas da hipocrisia subjacente aos seus pensamentos e actos ninguém os livra certamente.
-A hipocrisia do governo socialista de agora que cavou a desigualdade em Portugal.
Para poder ler melhor os números e argumentação que recomendo aponto novamente para os textos de Eugénio Rosa referidos no post anterior.

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quinta-feira, abril 12, 2007

A DESIGUALDADE EM PORTUGAL

Ontem ao ver aquela representação de Sócrates na RTP, quando se chegou à parte das perguntas sobre a governação, eu, sofri. Pedi insistentemente aos jornalistas que perguntassem ao socialista chefe do governo como explicava o aumento da desigualdade em Portugal, cavada ainda mais no período em que ele governara até ao momento.
Pedi. Voltei a pedir. Nada adiantou. Essa pergunta que eu achava fundamental não foi feita.
Há perguntas que não se fazem quando não se quer perguntar, quando não se quer saber a resposta ou quando não se sabe sequer que é uma pergunta a ser feita.
Eugénio Rosa é um economista com larga obra produzida. Ultimamente tem dedicado muito do seu tempo a produzir estudos sobre questões económicas de actualidade indiscutível. Não é mediático nas televisões e quando o convidam não lhe dão tempo para falar. Os seus estudos são, no entanto, extremamente claros e tantas vezes demolidores para com os economistas do regime.
Num resumo dum seu estudo recente ele mostra claramente como a DESIGUALDADE é imensa em Portugal e como tem aumentado nos últimos tempos.
Os jornalistas que entrevistaram Sócrates ontem e tantos outros que entrevistam ministros não lêem Eugénio Rosa. (Para bem das suas "carreiras" como jornalistas, diremos nós, que imaginamos como o poder económico e político que nos governa é tão implacável com jornalistas sérios e que não lhes façam fretes. Para mal da informação dos portugueses, dizemos nós também)
Repare-se na clareza deste resumo do estudo a que me referi:
"O Eurostat acabou de publicar dados sobre a repartição dos rendimentos nos países da União Europeia. Esses dados já abrangem o 1º ano do governo de Sócrates, ou seja, 2005. E eles revelam que as desigualdades na repartição do rendimento nunca foram tão elevadas em Portugal e nunca aumentaram tanto num único ano como sucedeu neste 1º ano de governo PS.
"Em 2005, em Portugal, os 20% da população com rendimentos mais elevados receberam 8,2 vezes mais rendimentos do que os 20% da população com rendimentos mais baixos, quando a média na União Europeia (25 países) era, nesse ano, de 4,9 vezes, ou seja, em Portugal a desigualdade neste campo era superior à média comunitária em 67,3%. Se se analisar a variação da desigualdade nos últimos dez anos conclui-se que é precisamente em Portugal o país onde ela mais cresceu. Entre 1995 e 2005, este indicador baixou na União Europeia dos 15 países mais antigos, onde Portugal se integra, de 5,1 para 4,8, enquanto em Portugal cresceu de 7,4 para 8,2. Mas é precisamente em 2005, com o governo de Sócrates, que as desigualdades neste campo aumentaram mais. Enquanto a nível da UE25 passou de 4,8 para 4,9, portanto agravou-se em 2%, em Portugal aumentou de 7,2 para 8,2, ou seja, registou um agravamento de 13,8%, isto é, 6,9 vezes mais que a média comunitária E tudo se verifica num País onde a riqueza criada por habitante é bastante inferior à média comunitária. Em 2006,por ex., o PIB por habitante SPA português correspondia apenas a 69,8% da média da UE25. A riqueza produzida é pouca em Portugal mas está cada vez mais mal repartida, o que torna a situação portuguesa ainda mais grave (interessa recordar que dois milhões de portugueses vivem actualmente ainda abaixo do limiar da pobreza)."
Se quiserem ler o estudo todo, lêem-no aqui.
E se quiserem escolher e ler muitos dos estudos desta pessoa notável, podem a eles aceder aqui, por exemplo.
Muito aprendi e aprendo com este economista!

sábado, abril 07, 2007

QUO VADIS FENPROF

Sou um incondicional do sindicalismo: acho-o imprescindível. Sou um participante crítico e construtivo do sindicalismo docente: sei por fora e por dentro como ele precisa de mudar. Refiro-me à Fenprof. Embora tenha achado e ache importante a unidade recentemente conseguida dos mais de dez sindicatos de professores existentes, não confundo a Fenprof com grupúsculos não representativos nem com sindicatos que tantas vezes fizeram fretes ao poder.
Actualmente existem duas candidaturas a secretário geral da Fenprof. Alguns dos colegas dentro do sindicato e fora do sindicato estão preocupados com o facto. Realmente seria bom que neste momento em que o ME/Governo deveria estar sobre fogo dos sindicatos/professores, seja dentro da própria Fenprof que as lutas se travam. Só que, meus caros colegas, eu próprio que não sou forte nas pelejas, reconheço a necessidade de um abanão na Fenprof. A Fenprof como projecto e prática sindical esmoreceu: de dificuldades naturais perante um poder imenso e bem para além da gesta pedagógica até a acomodações pessoais, tudo acontece um pouco nesta nossa Federação. A Fenprof que, quando surgiu, o fogo de Abril ainda aquecia os corações, encontra-se agora perante um arrefecimento que tolhe muitos dos seus protagonistas, outrora os mesmos.
A Fenprof precisa dum novo fogo. Precisa de saber colocar perante os professores, - grupo em que floresceram certas franjas acomodadas por um tempo mais propenso a dádivas e que hoje se encontra, todo, sob um ataque sistémico - uma responsabilidade pessoal e colectiva: a de defenderem a Educação Pública de qualidade, defendendo o valor (e para já a própria dignidade) de uma profissão.
-Para isso tem de chegar aos professores e, sejamos francos, há muitos anos que não chega convenientemente. Falta uma ligação mais directa aos professores, que os confronte com a sua responsabilidade no diagnóstico e na análise dos problemas e na proposição das respostas sindicais. (Sindicalismo, entenda-se, bem para além do tratamento de questões laborais como o poder têm tentado remetê-lo).
-Para isso tem também de trabalhar mais e, digámo-lo, há falhas nesse capítulo. Há evidências crescentes de um sindicalismo preguiçoso e acomodado.
-Para isso tem de cuidar a imagem e comunicação, a qual, muitas vezes, não tem sido a melhor escolhida na intervenção pública.
Dentro de dias vai dar-se a confrontação na indicação de duas personalidades para o cargo de secretário geral da Fenprof. Não tenhamos ilusões que outras questões irão assumir foros de cidadania nesse congresso. O que nele se discutirá será quem irá ser o novo secretário. Nem sei mesmo se tal será uma realidade pois quem lá estará já terá formado a sua opinião sobre tal decisão e assim o jogo estará já feito.
Eu tenho também uma opinião sobre quem é que queria ver no cargo máximo da Fenprof. Conheço os dois candidatos: ambos têm grandes qualidades. O Mário Nogueira já mostrou capacidade de liderança. A Manuela Mendonça ainda não mas nada a impedirá de um dia a vir a ter. Eu acho que neste momento o Mário merece vir a ser o próximo secretário geral da Fenprof. Provavelmente não o será, pela força das inerências e das duas direcções dos sindicatos que apoiam a Manuela. Se ganhar não terá a vida facilitada nos tempos mais próximos e é fácil saber porquê. A Manuela, que provavelmente ganhará, talvez tenha a vida mais facilitada na Fenprof. Por motivos que para mim não são os melhores. Atrás da Manuela arrasta-se muito do que critiquei acima na Fenprof e que persistirá na nossa federação. Não percebo algum entusiasmo de renovação com a candidatura da Manuela, sabendo que a imensa maioria dos protagonistas sindicais são os mesmos. O mesmo acontece, aliás, com o Mário, embora me pareça que possa protagonizar maior renovação.
Já ouvi dizer a alguns colegas com ar de saudade que nada será como dantes na Fenprof . Se fosse no bom sentido, como eu gostaria que isto acontecesse. É que a Fenprof precisa urgentemente de mudar para melhor.
Estranharão alguns que eu não tenha referido até agora as reais ou pretensas intromissões partidárias nestas questões de candidaturas. Meus amigos, é sincera esta minha forma de ler a questão. Os problemas da Fenprof são, neste momento, iminentemente sindicais. Não tenho ilusões: imagino como há movimentações partidárias (e não de um partido mas de vários). Elas são inevitáveis. Só que o importante aí é que os protagonistas saibam intervir no terreno político que é o sindicalismo e o saibam distinguir do terreno político-partidário. E, neste momento, o momento da Fenprof e os problemas da Fenprof são mais da natureza da prática e da reflexão sindical, onde os artífices, os sindicalistas, precisam de melhorar bastante e alguns, retirarem-se ou serem convidados, fraternalmente, a fazê-lo.
A Fenprof, infelizmente, prevejo, não será agora que encontrará um elan sustentado. No entanto afirmo, com orgulho, que nela me revejo, nela me apoio e a apoiarei, pois é, sem dúvida uma âncora que todos os professores deveriam acarinhar. Precisamente nestes tempos difíceis. E particularmente porque é aquela que, apesar de tudo, melhor representa os professores portugueses.

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sexta-feira, abril 06, 2007

O "espectro aceitável"

«A forma inteligente de manter as pessoas passivas e obedientes é limitar estritamente o espectro da opinião aceitável, mas estimular muito intensamente o debate dentro daquele espectro... Isto dá às pessoas a sensação de que o livre pensamento está pujante, e ao mesmo tempo os pressupostos do sistema são reforçados através desses limites impostos à amplitude do debate».
Noam Chomsky

Se repararmos bem é exactamente isto que está a acontecer em quase toda a nossa comunicação social pública ou privada em Portugal. Leia-se com esta grelha fornecida por Chomsky os programas de pretenso debate existente na televisão social cujo exemplo mor é o "Prós e Contras". A essência está assim explicada.

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segunda-feira, abril 02, 2007

Imaginem a Ministra numa aula de substituição.

Imaginem a nossa Ministra a dar uma aula de substituição. O que eu pagava para ver.

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domingo, abril 01, 2007

A Sociedade do Desconhecimento

Uma certa propaganda oficial bem sucedida vem impingindo-nos que cada vez estamos avançando para uma sociedade do conhecimento, em que cada vez mais as profissões exigem maiores qualificações e maiores conhecimentos. Ora essa seria sem dúvida uma boa notícia e um bom rumo para uma sociedade: pessoas mais sabedoras, mais qualificadas, mais evoluídas ao nível do conhecimento. Só que essa retórica encobre uma realidade bem diferente do que existe nos nossos países capitalistas mais desenvolvidos: há uma grande polarização entre trabalhadores, entre os que requerem uma grande qualificação obtida em estudos especializados de longa duração e aqueles (os ditos Mcjobs) que requerem qualificações mínimas e que se aprendem na realização das próprias tarefas. Em outros posts tenho alertado para estas questões.
Um artigo de jornal do público de hoje referia que a McDonald's está contra a definição de "Mcjobs" que já entrou em vários dicionários como "um trabalho pouco estimulante, mal pago e com poucas perspectivas, especialmente criado pela expansão do sector dos serviços". E tem tentado, até agora em vão, que os responsáveis pelos dicionários mudem esse termo e essa definição, ameaçando até recorrer aos tribunais. Neste artigo encontram-se dados absolutamente reveladores da realidade económica e do actual "mercado de trabalho" dos Estados Unidos da América. Vejamos: "um em cada três empregos nos EUA pagam salários baixos e não oferecem perspectivas de progressão ou melhoramento profissional"; "há cerca de 44 milhões de trabalhadores nos EUA a receber salários inferiores à média nacional de 16 dólares por hora, e sem acesso a seguro de saúde e a um plano de pensões". "E com demasiada frequência verificamos que estes empregos mal remunerados estão a substituir aqueles que durante décadas sustiveram uma vasta classe média"... "o mercado de trabalho está cada vez mais polarizado entre empregos muito bem pagos e empregos muito mal pagos, à custa da classe média".
É "interessante" no artigo do público ver como os professores estão entre as dez profissões mais mal pagas da América, embora essa lista, como diz no artigo, tenha sido "elaborada tendo em conta não apenas a remuneração líquida (o montante efectivamente ganho por cada hora de trabalho) mas também as condições de trabalho, as exigências físicas e psíquicas e a compensação social do trabalhador." É interessante como um artigo refere verdades tão importantes, significativas e globais mas embutidas num texto cujo título parecia circunscrever precisamente. Este é um exemplo de como o jornalismo, mesmo dentro de padrões conformes com o politicamente correcto nos pode fornecer informações importantes, mesmo que não intencionalmente (ou talvez não, ou não fossem a maior parte dos jornalistas vítimas duma exploração desenfreada do seu trabalho).
Aos professores portugueses, digo eu, a continuar a aprofundar-se as políticas neoliberais têm ainda muito a perder e muito por onde perder. O horizonte aponta para países mais "evoluídos" como os States. Resistir a este rumo é preciso.

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